A Paróquia Santa Bárbara, em Rocha Miranda, Zona Norte do Rio, inaugurou uma exposição que resgata a história da tradicional igreja, que recebe anualmente, em 4 dezembro, uma das maiores celebrações religiosas da cidade.
Fruto do projeto “Memórias de Bárbara: a comunidade salesiana de Rocha Miranda”, a mostra reúne fotos que ajudam a contar a relação entre a paróquia e os moradores da região. As imagens foram recuperadas depois de serem encontradas em caixas, onde passaram décadas armazenadas em condições inadequadas.
Até o momento, cerca de mil imagens puderam ser recuperadas, trazendo lembranças que remontam a 1957 - ano da fundação da paróquia, através de batizados, casamentos, missas e outras solenidades. Desse total, 23 fotos estão na exposição.
A restauração do acervo começou em 2022, quando o então pároco, padre Anselmo, encontrou pilhas de fotografias em um depósito na igreja, guardadas em sacolas plásticas e caixas mofadas. O material, que documenta décadas de eventos religiosos e sociais, foi entregue à conservadora-restauradora Sarah Santos, que aceitou o desafio de forma voluntária.
“Na hora eu pensei: que loucura! Mas vamos nessa. As fotos estavam em papéis oxidados, com cola, fungos, rasgos e marcas de caneta. Era um cenário crítico”, lembra Sarah, que é formada pela UFRJ.
Com a chegada do atual pároco, Romeu Dias, em 2023, o projeto ganhou ainda mais força e apoio institucional. A iniciativa tornou-se, inclusive, tema de conclusão da graduação e do projeto de mestrado da restauradora.
Trabalho movido pela fé dos devotos
O processo exigiu estudo e paciência. As fotos, datadas a partir de 1957, foram analisadas uma a uma, considerando o tipo de papel, a presença de danos e a necessidade de técnicas específicas de conservação. Sarah revela que teve o apoio de professores da UFRJ e de referências bibliográficas estrangeiras para desenvolver o método adequado.
“Foram dois anos de trabalho. Um ano inteiro dedicado apenas ao mapeamento de danos. O acervo é grande, mas conseguimos resgatar mil fotografias até agora”, diz.
As dificuldades, no entanto, foram muitas. A falta de verba e de estrutura física no templo obrigou a adaptação do espaço de restauração na residência de Sarah, onde há um ateliê. O projeto seguiu com a ajuda de doações e ofertas dos próprios paroquianos, que contribuíram também com informações e dados históricos, principalmente em relação às fotografias que não tinham data.
“Quando eu cheguei, iniciamos o trabalho de conscientização e valorização da história da paróquia junto aos paroquianos. Para a restauração fizemos o investimento na compra dos materiais necessários. Os recursos, muitas vezes, vinham do dízimo”, relata o padre Romeu.
Histórias que formam uma comunidade
As imagens revelam não apenas momentos religiosos de famílias, mas também evidenciam a forte ligação da igreja com a vida social e cultural de Rocha Miranda. Entre os "tesouros" do material, estão as visitas históricas do ex-presidente da República Eurico Gaspar Dutra e da cantora Elza Soares, além de registros das tradicionais festas e procissões em homenagem à Santa Bárbara, que costumam reunir cerca de 30 mil pessoas todos os anos.
“Esse acervo é importante não só para a paróquia, mas para todo o bairro. Ele mostra um lado poderoso e inspirador do subúrbio carioca, cheio de significados e memórias”, afirma Sarah.
A aposentada Solange Augusta Moura, de 82 anos, que participou da inauguração da pedra fundamental da igreja, comemora o resgate da memória da comunidade: "Eu acho nota dez! Graças a Deus, a nossa paróquia está, a cada dia que passa, melhorando. É muito importante e muito legal a gente conhecer, lembrar da história desde o início. Muita coisa que a gente não lembrava e agora passou a lembrar. E os jovens que estão começando agora, estão felizes de saber como tudo começou."
Solange também destaca o papel da paróquia para o entorno. "Temos vários eventos aqui, e não é evento para uma pessoa só, não, é para toda a família. Estamos sempre com almoços, com festas.... Acho que isso é muito importante para unir a comunidade à paróquia."
Legado
O trabalho de restauração é contínuo e ainda está longe de terminar. Mas a exposição, apresentada na Sala Mazzarello da paróquia, marca o início de uma nova etapa: a criação de um espaço permanente de memória.
”A meta é promover mais exposições e celebrações comemorando datas importantes. Iniciamos o processo de tombamento dos vitrais e temos o desejo de escrever um livro da história da Paróquia. E, além disso, temos um sonho ousado de construir um museu para expor as fotos, imagens, objetos antigos, relatando a história da paróquia e um pouco de Rocha Miranda”, detalha o padre Romeu.
“São resgates que inspiram outras instituições a fazerem o mesmo com suas memórias e acervos. E que lembram aos governantes a importância de valorizar o patrimônio cultural também nos bairros do subúrbio”, conclui Sarah.
História
Localizada na Rua dos Topázios, 471, a paróquia é um dos marcos da presença salesiana no Rio. A denominação remete à atuação dos Salesianos de Dom Bosco, congregação religiosa fundada pelo sacerdote italiano São João Bosco (1815–1888), e dedicada à educação e à evangelização de jovens, especialmente os mais pobres.
Seu estilo arquitetônico modernista, formado por três triângulos sobrepostos, não possui um registro oficial sobre o significado. Entre as interpretações possíveis, há quem associe a estrutura a um sonho atribuído a Dom Bosco — no qual ele teria visualizado três pequenas igrejas voltadas ao acolhimento de crianças carentes — ou, ainda, à passagem bíblica da Transfiguração de Jesus Cristo, quando Jesus, diante dos apóstolos Pedro, Tiago e João, teve sua aparência transformada e Pedro sugeriu erguer três tendas em sinal da presença divina.
A exposição pode ser visitada de segunda a sábado, das 8h ao meio-dia, e das 14h às 18h. Aos domingos e feriados, somente com agendamento na secretaria da Paróquia, que fica na Rua dos Topázios, 471, Rocha Miranda.