Entre as três mulheres nomeadas pelo Papa como membros do dicastério para os bispos está a Irmã Yvonne Reungoat FMA, ex superiora geral das Filhas de Maria Auxiliadora. O carisma salesiano levou a religiosa nascida em Plouenan (Finistère, França) em 1945, a dar prioridade à atenção aos jovens em formação, ao saber cuidar da pobreza e do sofrimento dos últimos e a formação dos animadores. Sua capacidade de inculturação na realidade africana era notável. Ela é presidente da União dos Superiores Maiores da Itália (Usmi), e nos concedeu esta entrevista com uma calorosa disponibilidade.

A senhora esperava esta nomeação?

Não, eu absolutamente não esperava. Eu tinha visto que o Papa tinha falado desta sua intenção, e a considerei uma boa notícia, mas absolutamente não pensei que eu poderia estar lá também. Foi uma surpresa total que recebi e junto as mensagens de felicitações.

Estas são nomeações que fazem parte da pronta aplicação do Praedicate Evangelium. Qual seu comentário sobre o caminho que levou a este documento?

Acho que o documento tenha amadurecido ao longo dos nove anos do pontificado. Logo que assumiu, o Papa Francisco começou a pensar, com o Conselho dos Cardeais em uma reforma da Cúria. Um período que certamente exigiu muito trabalho, reflexão, discernimento para chegar à promulgação desta Constituição Apostólica. Para mim é um sinal muito evidente da coerência do Papa Francisco que havia recebido as indicações e que seguiu as exigências e as necessidades da Igreja, através de algumas reformas progressivas. É um documento que dá um rosto importante à Cúria Romana, na minha opinião, porque reconhece o papel dos leigos e das mulheres que podem assumir responsabilidades superiores em alguns dicastérios. Sinal de uma mentalidade, de uma mudança profunda na minha opinião, de um espírito que orienta o Papa na esteira do Concílio Vaticano II e que se realiza progressivamente. Sinal de grande esperança e também de responsabilidade, porque chama todos à co-responsabilidade nas várias vocações da Igreja.

Qual será exatamente a sua tarefa?

Não sei te dizer, a notícia é tão nova! Colaboraremos na nomeação de bispos em todo o mundo. De que forma não sei, pois ainda não tenho nenhuma indicação concreta. O que se pode pensar é que poderemos ser chamadas para estudar o resultado das consultas que os núncios enviam à Secretaria de Estado, estudar esses dossiês e dar um parecer para facilitar a escolha dos futuros bispos.

Que qualidade a senhora considera prioritária em um bispo?

Certamente a de ser um pastor, um sacerdote que manifesta no seu modo de viver uma capacidade de proximidade com as pessoas, de escuta, de acompanhamento e de envolvimento de todas as vocações na sua própria Igreja local. Nesse sentido, considero particularmente importante o caminho da sinodalidade que a Igreja está trilhando. Um pastor tem o senso de sua responsabilidade, mas ao mesmo tempo também ouve o mundo fora da Igreja. Porque a Igreja não existe para si mesma, mas existe para o mundo, para todas as pessoas de boa vontade. Por isso deve ter um espírito missionário, de grande abertura.

Em que medida a sua experiência anterior como Superiora Geral de sua Congregação e sua missão na África poderão, por exemplo, ajudar nessa tarefa?

Certamente me ajudará a visão de uma Igreja universal inserida em um mundo que está passando por profundas mudanças em todos os lugares e que deve responder a muitos desafios para a evangelização e para o relacionamento com as outras religiões no mundo. O fato de ter sido Superiora Geral de um instituto como o nosso me deu uma experiência única de conhecer os cinco continentes e de ter contato e conhecimento direto deles através de nossas comunidades ou dos encontros com os bispos onde estamos presentes e com as pessoas. Uma experiência de amplos horizontes que me fez de certa forma mudar os padrões mentais que eu poderia ter tido antes. Deu-me essa sensação de grande respeito pela diversidade, pela diversidade cultural, também pelo tempo que é preciso conhecer e não esperar. É preciso muita escuta, muita observação.

E como o carisma das Filhas de Maria Auxiliadora lhe ajudará?

O nosso é o carisma educativo. Por um lado, creio que é um carisma missionário aberto a todos. É certamente um elemento que me ajudará a ter uma abordagem aberta às várias Igrejas locais. Depois acredito que também os bispos devem ter claro a importância da educação no caminho da fé e no caminho da Igreja. Porque a educação é a base de tudo, a base da construção da sociedade. É a base fundamental para acompanhar a construção da personalidade a partir dos pequenos.

Deste ponto de vista, a senhora acha que também os bispos deveriam ser 'dóceis' a uma espécie de 'educação' a partir da base do povo de Deus?

Certamente, por isso estava falando da escuta, escuta profunda. Na verdade, nos educamos uns aos outros. Acho que não se pode ser pastores sem antes colocar-se em escuta e deixar-se, eu diria, ensinar, guiar pelo povo, pela base. Se não existir essa atitude básica, corre-se o risco de construir edifícios a partir do telhado e de não lançar as bases para a evangelização, de não chegar ao coração das pessoas. E se você não chega ao coração das pessoas, você não evangeliza e não anda junto. Todos somos chamados a escutar a realidade e discernir juntos os caminhos que o Espírito nos pode indicar.”

O Papa Francisco, na entrevista concedida à Televisa, afirmou - entre outras coisas - que se renunciasse ao seu ministério petrino gostaria de ser chamado, de fato, de 'bispo emérito'. E que gostaria de confessar as pessoas e visitar os doentes. Como a senhora vê essas declarações?

Chegaram ao meu coração. Porque o Papa Francisco situa-se precisamente nesta linha de pastor que se coloca ao serviço, na simplicidade. Corresponde ao que ele é. Estou impressionada com a coerência do Papa Francisco entre o que ele diz, o que ele ensina e as escolhas que faz. E esta é uma delas, é um sinal  também para mim, que concluí a missão de Superiora Geral em outubro passado e agora vivo sendo filha de Maria Auxiliadora como todas as outras.

Fonte: Vaticano News

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