Em novembro, o Centro Salesiano do Aprendiz (CESAM) de Goiânia promoveu o Mês da Consciência Negra, com programação dedicada à troca de conhecimentos, conscientização sobre a igualdade étnico-racial e celebração da cultura negra. A iniciativa já faz parte do calendário temático anual da instituição, reflexo de um compromisso ético, social e cristão de combate ao racismo e a discriminação racial.
O estudo “Percepções sobre o racismo” aponta que o Brasil é racista para 81% das pessoas entrevistadas e 51% afirma já ter presenciado situações de racismo. Realizado pelo Instituto de Referência Negra Peregum e pelo Projeto SETA, o levantamento mostra que 67% dos participantes da pesquisa acredita que as leis que criminalizam o racismo no país não são suficientes para evitar as práticas discriminatórias.
Perguntados sobre a principal forma de manifestação do racismo, 66% dos entrevistados acredita que é a violência verbal, 42% o tratamento desigual e 39% a violência física. Para 76% deles, pessoas negras são mais criminalizadas e punidas que pessoas brancas. O ambiente escolar é apontado por 38% dos participantes da pesquisa como principal local onde já sofreram racismo, para 29% é o trabalho e 28% afirma que são nos espaços públicos.
A supervisora de aprendizagem da instituição, Vanessa Rodrigues afirma que os dados reforçam a importância da mobilização em promover uma iniciativa que vai além de algumas palavras em um comunicado. “Atuamos em prol da juventude em situação de vulnerabilidade social. Temos o compromisso de orientá-los a respeito de seus direitos e deveres também do ponto de vista étnico-racial. Proporcionar o acesso à informação, conscientização e, especialmente, o amparo a esses jovens é crucial. É uma semente que plantamos juntos para um futuro melhor para eles, suas famílias e toda a comunidade.”
Vanessa ressalta que o Mês da Consciência Negra foi também uma oportunidade de apresentar e ensinar um pouco da sobre a cultura afro-brasileira. “As experiências que valorizam os saberes, corpos, costumes e a arte também são fundamentais. Tivemos o imenso prazer de receber a equipe de capoeiristas do mestre Charm, que realizou uma roda de capoeira com os aprendizes. É uma expressão cultural única, que integra dança, luta e música. Foi incrível ver nossos jovens aprendendo, interagindo e participando dessa importante manifestação cultural.”
De acordo com os dados da base de aprendizes do Programa de Socioaprendizagem do CESAM Goiânia, cerca de 80% dos jovens e adolescentes atendidos se declaram negros ou pardos. Segundo a educadora Mônica Godoi, o Mês da Consciência Negra é uma iniciativa que também contribui para o fortalecimento sociocultural dos jovens e adolescentes atendidos pela instituição. “É uma oportunidade para discutir as questões relacionadas ao racismo e à desigualdade social, mas também um momento de sensibilização, celebração e valorização da cultura afro-brasileira.”
A educadora conduziu os aprendizes em uma semana de estudos dirigidos sobre personalidades que se tornaram ícones de luta e resistência negra. “Um exemplo é a escritora e ativista Carolina Maria de Jesus que, através de sua obra ‘Quarto de despejo’, deu voz à realidade de muitos que vivem à margem da sociedade. Não é apenas uma data no calendário, mas uma oportunidade de reafirmar a importância da igualdade, da inclusão e do respeito à diversidade.”
Os jovens também conheceram a história do Zumbi dos Palmares, líder quilombola cuja data de falecimento marca o Dia Nacional da Consciência Negra (20 de novembro), instituído pela Lei 10.639/2003. “Ele é um símbolo de luta pela liberdade. Sua bravura em combater a escravidão inspira gerações e lembra a importância de combater a opressão.” A lei também torna obrigatório o ensino de história e cultura afro-brasileira nas escolas dentro da grade curricular, sendo elas públicas ou particulares. No entanto, os dados da Peregum e do Projeto SETA revelam que somente 46% dos brasileiros entre 16 e 24 anos afirmam ter aprendido sobre o tema nas aulas.
O Mês da Consciência Negra também contou com a Formação Permanente de Aprendizes, promovida pela Comissão de Inculturarte do CESAM Goiânia. A capacitação foi conduzida pela educadora Anna Carollyne Paz, abordando como tema “Onde você esconde o seu racismo?”. Ela explica que o encontro teve como objetivo esclarecer e desmistificar questão raciais que afetam diretamente a comunidade negra do país. “A formação foi um momento enriquecedor de muita troca de experiências e conhecimento da visão jurídica, social e cultural acerca do racismo, frisando sempre que este é um crime inafiançável e imprescritível.”
Após a formação, a comissão realizou uma mostra de cinema, com sessões de filmes que evidenciam a cultura negra, incluindo: Pantera Negra; A Cor Púrpura; Green Book; O ódio que você semeia. “Eventos como esses marcam a vida dos nossos meninos. O racismo deve ser tema frequente dentro das instituições de ensino, pois é com conhecimento e denúncia dos casos que erradicamos esse mal que tanto nos assombra”, reforça a educadora.
O aprendiz Elieser Gustavo afirma que o Mês da Consciência Negra foi uma experiência muito importante e transformadora. “O que muitas pessoas acham que é só mais um feriado, para tantas outras tem um significado enorme. O CESAM Goiânia nos relembra o sentido da conscientização, orientando e fazendo refletir sobre esse tema não só em novembro. Não podemos esquecer o real motivo dessa data.”
Já o aprendiz João Renato de Paula ressalta que a iniciativa contribui para ajudar os jovens e adolescentes a conhecerem e entenderem a importância da luta antirracista. “A nossa mobilização precisa ser todos os dias. O CESAM Goiânia mostra para nós, jovens que ainda estamos amadurecendo, como a sociedade pode ser melhor. Aqui, aprendemos sobre nossos direitos e deveres. Perante a lei, todo mundo é igual. Então, é mais uma forma de nos instruir sobre a vida em sociedade como um todo.”
Além das atividades direcionadas aos aprendizes, a instituição promoveu também a Formação Permanente de Educadores. A capacitação acontece periodicamente com todos os colaboradores, recebendo especialistas voluntários para debater assuntos sociais relacionados à: cidadania, educação e promoção de direitos. Esta edição abordou o tema “Combate ao racismo: seus aspectos legais”, conduzido pelo advogado e representante do Movimento Negro Unificado, Wanderson Pinheiro.
A capacitação explorou conhecimentos jurídicos, práticas sociais do cotidiano e experiências vividas pelos participantes para promover a reflexão sobre privilégios e preconceitos. “O CESAM Goiânia congrega o pensamento de fraternidade de Cristo e faz um trabalho sensacional. É elementar a gente fortalecer a cultura de prevenção de crimes raciais tanto dentro da instituição quanto também pelas pessoas que são por ela assistidas”, afirma o advogado.
A diretora executiva da instituição, Rosângela Rodrigues, afirma que o Mês da Consciência Negra é uma iniciativa importante não só para atualizar os educadores e aprendizes, mas principalmente promover a luta antirracista em toda a sociedade. “Precisamos ser conscientes e comprometidos com a justiça social. Em nosso ambiente de missão, levamos muito a sério os valores institucionais de nossa inspetoria, incluindo a promoção da igualdade étnico-racial. São valores que Dom Bosco também nos deixou como legado.”
O CESAM Goiânia segue o sistema preventivo-pastoral salesiano em todas as atividades, baseado nos pilares: razão, religião e amorevolezza. Rosângela reforça que a instituição tem o cuidado de promover e motivar a fraternidade e o respeito às diferenças, essenciais para a formação de bons cristãos e honestos cidadãos. “Nós, que seguimos a Jesus de Nazaré, temos que dar testemunhos de nossa fé com ações cotidianas de respeito ao próximo, independentemente da cor da pele. O racismo destrói vidas, sonhos e sentimentos. É nosso dever de cristão combatê-lo!”